RESPOSTA À CONSULTA TRIBUTÁRIA 23922/2021, de 07 de outubro de 2021.
Disponibilizado no site da SEFAZ em 08/10/2021
Ementa
ICMS – Serviço de transporte – Mercadorias não entregues ao destinatário por recusa no recebimento – Prazo para retorno.
I – A recusa no recebimento da mercadoria, por parte do destinatário, caracteriza-se como devolução.
II – No eventual retorno da mercadoria ao estabelecimento remetente, com a decorrente necessidade de transporte da mercadoria ao estabelecimento de origem, inicia-se uma nova prestação de serviço de transporte (artigo 2º, inciso X, RICMS/2000).
III – O local desta nova prestação, para os efeitos da cobrança do imposto e definição do estabelecimento responsável, é o local onde se iniciou a nova prestação. Desse modo, caso esta prestação de serviço seja iniciada em outro Estado da Federação, caberá a este disciplinar as obrigações tributárias principal e acessórias a ela concernentes.
IV – Iniciando-se o retorno da mercadoria no Estado de São Paulo, deverá ser emitido um novo Conhecimento de Transporte Eletrônico (CT-e), com destaque do imposto.
V – A permanência da carga no estabelecimento transportador para eventuais procedimentos operacionais que se fizerem necessários ao retorno de mercadoria não entregue faz parte da atividade da empresa transportadora, não existindo, na legislação paulista relativa ao imposto estadual, limite de tempo para essa estadia.
VI – A inexistência de limite temporal para a estadia inerente ao serviço de transporte não permite sua utilização para encobrir negócios jurídicos de outra natureza. A estadia deve se dar por tempo razoável e ser inerente à prestação do serviço de transporte.
VII – Eventuais valores cobrados a título de estadia, bem como outros valores cobrados do tomador do serviço de transporte, devem fazer parte da base de cálculo do ICMS.
Relato
1. A Consulente, que tem como atividade principal declarada no CADESP o transporte rodoviário de carga, exceto produtos perigosos e mudanças, municipal ( CNAE: 49.30-2/01), bem como atividades secundárias relacionadas ao transporte rodoviário intermunicipal, interestadual e internacional, depósito de mercadorias para terceiros e serviços de logística, apresenta sucinta consulta na qual indaga se existe um prazo previsto na legislação para o retorno de mercadoria não entregue ao destinatário por recusa de recebimento.
Interpretação
2. Preliminarmente, cabe esclarecer que a recusa no recebimento da mercadoria representa a hipótese em que a mercadoria retorna ao estabelecimento de origem sem que o destinatário a tenha recebido, ou seja, não deu entrada dela em seu estabelecimento nem emitiu o documento fiscal referente a sua saída.
3. Por sua vez, o inciso IV do artigo 4º do RICMS/2000 expressamente conceitua como “devolução de mercadoria, a operação que tenha por objeto anular todos os efeitos de uma operação anterior”.
4. Em decorrência, a operação de entrada de mercadoria que retornou ao estabelecimento remetente, em virtude de recusa no recebimento pelo destinatário, caracteriza devolução, na medida em que tem como objeto a anulação da operação de saída desta mercadoria.
5. O eventual retorno da mercadoria ao estabelecimento remetente, com a decorrente necessidade de transporte da mercadoria ao estabelecimento de origem, é circunstância extraordinária, a qual, em regra, representa o início de uma nova prestação de serviço de transporte (artigo 2º, inciso X, RICMS/2000).
6. Iniciando-se o retorno da mercadoria em outro Estado da Federação, caberá a este disciplinar as obrigações tributárias principal e acessórias a ela concernentes, conforme artigo 11, inciso II, “a”, da Lei Complementar 87/96 e artigos 2º, inciso X, e 36, inciso II, "a" do RICMS/2000. Caso o retorno da mercadoria tenha início neste Estado, deverá ser emitido um novo CT-e, com destaque do imposto, desde que o início dessa prestação seja em Município diverso daquele ao qual pertence o estabelecimento remetente original, destinatário da prestação de serviço de transporte referente ao retorno.
7. Na hipótese de estarem localizados no mesmo Município, pelas regras do ICMS, não haverá emissão de CT-e, haja vista que é vedada a emissão de documento fiscal que não corresponda a uma efetiva prestação de serviço de transporte intermunicipal ou interestadual, exceto nas hipóteses expressamente previstas na legislação (artigo 204 do RICMS/2000).
8. Todavia, o artigo 207 do RICMS/2000 dispõe que:
“Artigo 207 - O retorno da carga por qualquer motivo não entregue ao destinatário poderá ser acobertado pelo conhecimento de transporte original, desde que conste o motivo no verso desse documento (Lei 6.374/89, art. 67, § 1º, e Convênio SINIEF-6/89, art. 72, na redação do Ajuste SINIEF-1/89, cláusula segunda).”
8.1. Cabe elucidar que, no retorno de mercadoria não entregue ao destinatário, em vista das circunstâncias históricas, e considerando a situação extraordinária que é o retorno, o dispositivo supracitado autoriza a utilização do conhecimento de transporte original para acobertar essa nova prestação de serviço de transporte. Todavia, o contribuinte não está dispensado da emissão de novo documento fiscal relativo a esse novo transporte, a fim de regularizar o devido lançamento do imposto. Explica-se.
8.2. Nesse ponto, cumpre elucidar que o citado dispositivo foi elaborado em uma época em que o Conhecimento de Transporte Rodoviário de Cargas (CTRC), modelo 8, em papel, servia para acompanhar o transporte da carga, devendo ser emitido antes do início da prestação do serviço (artigo 152 do RICMS/2000). No entanto, ante a dificuldade técnica-operacional de emissão do CTRC para acompanhar o transporte de retorno de mercadoria não entregue e a necessidade de se resguardar o contribuinte em caso de interpelação fiscal durante o trajeto, levou o legislador a autorizar a utilização do CTRC original para acobertar o transporte de retorno. Contudo, com o advento do Decreto 53.629/2008, sobreveio o Conhecimento de Transporte Eletrônico (CT-e), modelo 57, e o respectivo Documento Auxiliar do Conhecimento de Transporte Eletrônico (DACTE), o qual serve para acompanhar a carga durante o transporte (artigo 212-O, §9º, item 3, alínea “a” do RICMS/2000).
8.3. Assim, haja vista a obrigatoriedade de emissão do CT-e em substituição ao CTRC (artigo 1º, inciso I, da Portaria CAT 55/2009), deve ser emitido um novo CT-e para acobertar o retorno de mercadoria não entregue ao destinatário. Enfatize-se que o CT-e pode ser emitido remotamente (até por meio de tablets ou smartphones) e, nessa situação, será necessário que os prepostos estejam munidos de equipamento para impressão do respectivo DACTE.
9. Portanto, de todo o exposto, na hipótese de devolução de mercadoria, tem-se o início de uma nova prestação de serviço de transporte. Neste caso, deve ser emitido um novo CT-e, independentemente de o retorno da mercadoria ter sido acobertado pelo CT-e original, e, por se tratar de devolução em virtude de recusa, indicará como remetente e destinatária, o tomador do serviço.
10. Feitas essas considerações gerais acerca dos procedimentos fiscais para operacionalização do retorno da mercadoria não entregue em decorrência de recusa no recebimento por parte do destinatário, e respondendo o questionamento realizado pela Consulente, ressalta-se que o regulamento paulista do ICMS não define prazo “de validade” para a Nota Fiscal ou limite de tempo para que a empresa transportadora mantenha as cargas em sua posse até a efetiva saída de seu estabelecimento em retorno ao remetente original das mercadorias. Dessa forma, depreende-se que a mercadoria pode permanecer no estabelecimento da Consulente (transportadora) pelo tempo necessário e inerente a sua prestação de serviço de transporte, independendo da data de emissão da Nota Fiscal ou do CT-e emitido para a prestação.
11. Portanto, não havendo prazo legal para estadia, essa pode se dar, a princípio, pelo tempo que se fizer necessário para a correta consecução da prestação do serviço de transporte. Contudo, há de se advertir que a estadia não pode ser utilizada para desvirtuar a natureza jurídica do serviço de transporte e encobrir o negócio jurídico efetivamente ocorrido. Sendo assim, a estadia deve ser, não só por tempo razoavelmente curto, como, sobretudo, inerente à prestação do serviço de transporte.
12. Frisa-se, ainda, que, se houver cobrança de estadia, este valor fará parte da base de cálculo do ICMS, bem como qualquer outro valor cobrado do tomador, e deverão constar do CT-e emitido para a prestação do serviço.
13. Por fim, sem embargo de todo o exposto, cumpre registrar que, se chamada à fiscalização, caberá a Consulente a comprovação por todos os meios de prova em direito admitidos da situação fática efetivamente ocorrida, nos termos expostos na presente consulta. Por sua vez, a fiscalização poderá, em seu juízo de convicção para verificação da materialidade da prestação, se valer de indícios, estimativas, análise de operações pretéritas, dentre outros elementos que entenda cabíveis. Assim, recomenda-se à Consulente que mantenha controles e demonstrativos claros passíveis de apresentação ao fisco.
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